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sábado, 21 de junho de 2014

No meio (termo) é que está a virtude



O respeito e o medo sempre andaram de mãos dadas. Embora sejam coisas muito diferentes, sempre houve e continua a haver tendência para misturar os dois. O que se tem vindo a alterar são as personagens, o poderoso e o submisso.
Se há décadas atrás os pais eram vistos como autoridade máxima, hoje são vistos como o elo mais fraco que tem como único propósito cuidar, proteger e alimentar os filhos. 
Se os professores eram vistos como alguém superior, intelectualmente mais evoluídos e letrados, hoje a sua obrigação é aturarem miúdos mal educados, sem poderem levantar a voz, correndo o risco de processos disciplinares ou, no pior dos cenários, o despedimento. 
A sociedade foi mudando os seus costumes e as excepções à regra sempre foram demasiado evidentes. Uma coisa é certa, tem sido raro o meio termo no que diz respeito à educação das crianças. Não defendo o padrão que criámos e no qual vivemos hoje em dia. A liberdade que os jovens têm nos dias que correm, mudou de nome. Só me ocorre a palavra anticivismo.
No entanto, o que muitas vezes existia nas escolas em Portugal era de um profundo desrespeito pelos direitos das crianças. Pequenas e indefesas, muitas foram aquelas que foram abusadas pelos próprios professores, sem meio de se defenderem e com o aval dos próprios pais. 
Fosse porque provinham de classes trabalhadoras e humildes, fosse porque um professor era considerado um ser mais evoluído e que por isso deveria saber o que era melhor para os filhos, mesmo que isso incluísse uma tareia. 
Em tudo o que se rege pelo excesso, nunca pode gerar um meio termo. Essa exigência cega de castigar uma criança pequena, partindo do principio que quanto mais cedo aprender, melhor desempenho terá no futuro, gerou o pior dos pesadelos. Um pai ou uma mãe que foram mal tratados em criança, só deseja que o seu filho nunca passe pelo mesmo, adoptando assim a postura contrária de uma super protecção desmedida. 
O resultado está à vista. Hoje tudo é permitido e quem tem que se pôr a pau são os pais e os professores. 
Sempre tive sorte. Nunca levei réguadas, tendo-me ficado por um ou dois puxões de orelhas. Sempre que me queixava de um professor, lá em casa, a pergunta que me faziam era: "E tu? O que fizeste para merecer tal castigo?"
Obrigavam-me a pensar nas minhas atitudes, e ao mesmo tempo ilibavam o professor de ter agido levianamente. Aquilo aborrecia-me, mas nada podia fazer. Lembro-me de ter tido uma professora na terceira classe que era intragável. Chegou a humilhar-me várias vezes em frente à turma inteira e sei que a tortura psicológica levou a recusar-me a ir à escola. A minha mãe falou com a senhora e em vez de me defender explicou que eu era uma criança muito nervosa, pois tinha tido meningite aos 4 anos de idade e que isso tinha gerado alterações no meu estado emocional.   
Conclusão: deixou de gritar tanto comigo, mas passou a tratar-me como uma atrasada mental. Do mal o menos. Ao menos não implicava tanto comigo.
O caso de uma amiga minha, foi mais grave. Aos sete anos de idade, levou uma tareia de uma professora, deixando lhe um olho negro por uns dias e uma ferida aberta no coração por toda a vida. As lágrimas saltam dos seus olhos quando recorda o que passou. Não tanto pela tareia em si, mas pelo aglomerado de situações que provieram disso. 
Descreve-se hoje em dia como uma pessoa submissa e que se deixa pisar constantemente, anulando-se muitas vezes em prol dos outros. Não sou psicóloga, mas é engraçado analisar o que se passou há tanto tempo e transpor isso para os dias de hoje. 
A sua família é de origens humildes e trabalhadoras e quando o incidente aconteceu, passaram uma borracha no assunto. Talvez por acharem que a criança era irrequieta e que mereceu, talvez porque se sentiram impotentes perante a superioridade da professora, ou talvez por que lhes tenham dito que a dita professora estava a uns meses da reforma e que não valia a pena instaurar um processo. 
Fosse como fosse, todo este conjunto de factores e acontecimentos, moldou a personalidade da minha amiga. Hoje considera-se uma pessoa que não se sabe defender e que se sente impotente perante um filho que precisa de si para tudo. 
Dois factores importantes nesta história:
- a menina que ela foi, já não é
- o que lhe fizeram serviu para o que serviu, mas já não serve mais
Lá atrás era uma criança indefesa, hoje é uma mulher que tem como missão criar um filho e defendê-lo de gente estúpida e ignorante. O que passou, permitiu-lhe sobreviver até hoje, mostrando-se submissa e conseguindo assim evitar conflitos que poderiam marcar de forma negativa a sua vida.  
No entanto, o que passamos serve para o que serve e deve ser deixado no momento como lembrete e não como uma mágoa que temos que carregar acorrentada aos pés. Lembrei-a que talvez esteja na hora de perdoar todos os intervenientes naquele episódio e seguir em frente. Disse-me que não conseguia e aí percebi que resistia a despir o fato de submissa. Ainda se sente muito confortável nele. 
Poderá permanecer com ele vestido por muito tempo, mas isso só lhe atrasará o passo. Se queremos o meio termo, há que começar por nós próprios. Acho que a forma da vida nos dizer que temos que nos defender, é enviando pessoas que não serão de todo muito simpáticas connosco. Devemos agradecer também a essas pessoas. Talvez mais do que àquelas que nos protegem. São essas figuras que nos marcam negativamente, que nos fazem crescer mais depressa. 
São elas que nos ensinam a lidar com o pior e a dar valor ao que de melhor temos. No dia em que conseguirmos fazer este exercício de perdão e de agradecimento, gera-se uma paz que levará ao meio termo. Isto porque reconhecemos o melhor e o pior dos outros e saberemos com certeza defender-mo-nos sem agredir e respeitar sem temer.





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